segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Olga Maria Mendes Leão

expedição cientifica a sobral

Em 1919, uma expedição científica inglesa esteve em Sobral/CE para observar um fenômeno de certo modo comum: um eclipse solar. Não teria nenhuma repercussão maior, se não fosse pelo fato que tal expedição lá estava, com todo seu aparato de equipamentos e conhecimentos, para comprovar as idéias da Teoria da Relatividade Geral. Resumidamente, essa teoria afirma que grandes massas são capazes de causar desvios na trajetória da luz, em particular, da luz que recebemos do sol. Sobral oferecia, além da ótima visibilidade do fenômeno, uma localização particularmente interessante, próxima à linha do equador. Mais tarde, o próprio Albert Einstein diria: “O problema que minha mente formulou foi respondido pelo luminoso céu do Brasil”, em sua visita à América do Sul. Seis anos mais tarde, enquanto Einstein desembarcava no Rio de Janeiro, no dia 21 de março de 1925, agora como um renomado cientista, os jovens Bias e Walda (meus avos maternos) casavam-se em Sobral.

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Cel. Antonio Enéas Pereira Mendes e Regina Sabóia de Aragão Mendes

Sobral era uma cidade que abrigava diversas famílias de origem aristocrática,o que lhe conferia “status” político relevante. Além disso, por sua posição geográfica e o imenso vale formado pelo Rio Acaraú, oferecia grandes áreas para produção agrícola e pecuária. Essas, a propósito, eram as atividades do Cel. da Guarda Nacional, Antonio Eneas Pereira Mendes (meu bisavô materno), cuja família estava presente na região desde o século XIX. O Cel. Enéas casou-se com Regina Sabóia Ximenes de Aragão (minha bisavó materna, que passou a se chamar Regina Sabóia de Aragão Mendes), também de famílias tradicionalíssimas na região, constituindo uma família de onze filhos, entre os quais, Bias de Aragão Mendes (o qual chamarei de Vovô). O nome Bias, o qual, assim como seu pai Cel. Enéas, também tem origem grega, lhe foi dado em homenagem ao seu tio, um poeta que faleceu aos 25 anos de idade, vitima de tuberculose. O Cel. Enéas era líder político e atuava no campo das articulações, nunca tendo concorrido a nenhum cargo eletivo. A respeito do Cel. Enéas, o primo Ademar faz a seguinte citação (1):

“Foi Chefe do Partido Rabelista em Sobral, tendo recusado a nomeação para o cargo de Juiz Federal, para não perder a sua independência, por força de um cargo político, segundo informa o Mons. Vicente Martins, em “Homens e Vultos de Sobral”.

A sua rotina e de seus filhos incluíam o trânsito entre a “Chácara Estreito”, uma de suas propriedades rurais (outra, fora de Sobral, se chamava “Novo Mundo”) e a cidade. Mais tarde, por volta de 1940, Vovô Enéas adquiriu uma grande casa, situada na esquina em frente à Praça da Igreja São Francisco, abaixo, (onde fica o monumento alusivo a Independência, com oitão lateral para a rua que passa no lado direito do Colégio Santana), mudando-se para a cidade.

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Na manhã daquela terça-feira, dia nove de agosto de 1927, os primeiros raios do brilhante sol de Sobral, atingiam o cume da Serra da Meruóca. Com sua beleza natural e clima muito agradável, era lugar de veraneio das famílias mais abastadas da região, que lá mantinham casas para esse fim.

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Descendo, como que colorindo a paisagem, a luz continua seu percurso, iluminando agora a Estação Ferroviária, onde muitas pessoas, andando de um lado para outro, aguardavam o trem para seguir viagem para Crateús (um trecho que havia sido inaugurado recentemente, em 1926). Também estavam lá os que iam para Camocim, Ipu, Fortaleza, entre tantos destinos e os que esperavam a chegada de seus entes queridos. Ali ainda estavam os comerciantes que iam embarcar suas mercadorias e os que iam buscar suas encomendas. Carregadores passavam de um lado para outro com os fardos nas costas ou sobre suas cabeças. Enquanto isso, meninos com “quartinhas” e um caneco na mão gritavam oferecendo “agueiro frio”. O movimento era intenso. Havia os vendedores de bolo, de broa, de roscas, de laranja, de café, de picolés e de objetos regionais.

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Mais um pouco e uma nuvem de vapor que emanava das águas do Rio Acaraú encontravam os raios de luz, exibindo um balé natural, cujos movimentos formavam figuras de acordo com a imaginação de cada observador. Freqüentadores do Teatro São João, logo viam bailarinos a voar, rostos tristes e alegres das diversas peças ali apresentadas.

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Passando pela Santa Casa de Misericórdia (idealizada por D. José Tupinambá da Frota e inaugurada em 24 de maio de 1925), pelo Colégio Sant’Ana (antigo sobrado do Senador Paula Pessoa, avô de Tio Victor de Paula Pessoa), pelo Palácio das Ciências e Línguas Estrangeiras (antigo Palace Club, inaugurado em 1924 para receber a elite sobralense para festas e bailes) e pela torre da Igreja São Francisco, a luz agora aquece, em sua totalidade, a bela e histórica cidade.

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A “Casa Grande” em 2008

Na grande “Casa Grande” da “Chácara Estreito”, as imponentes janelas se abrem. Lá dentro, a jovem Walda Cavalcante Mendes (a qual chamarei de Vovó), com apenas 16 anos, sentia as dores do parto. Vovó era filha do casal Manuel Pacífico Cavalcante e Luísa de Albuquerque Limaverde Cavalcante. Ficou órfã dos pais muito cedo, passando a morar com seus tios José de Castro Filgueiras e Belalinda Albuquerque Limaverde Filgueiras, que a adotaram como filha, lhe proporcionando uma educação consistente e adequada para as moças daquela época. Além da educação religiosa, que lhe ajudou a definir um caráter irretocável, e da educação formal, que incluía o comportamento e etiqueta, Vovó recebeu aulas de piano e ballet.

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Vovô Bias e Vovó Walda

Além de inteligente e criativa, Vovó era delicada e elegante, em todos os aspectos. Tio Aristóbulo (Diretor Geral da Agricultura do Estado do Ceará), que era filho deste casal, era bem mais velho do que Vovó. Foi por conta de sua profissão que meus avôs se conheceram em Sobral/CE. Quanto ao parto, as providências estavam sendo tomadas, para que tudo corresse muito bem. A parteira já estava avisada e pronta. Vovô, com apenas 26 anos, tentava controlar a ansiedade pelo nascimento de seu primeiro rebento. Do lado de fora do casarão, os empregados haviam tirado o leite, outros “tratavam” as galinhas, o gado se movimentava em busca de pasto, enfim, a vida seguia seu curso normal, em um dia que estava particularmente bonito, como se Deus o houvesse preparado especialmente para aquela ocasião. Lá dentro, a Vovó se esforçava para não incomodar aos outros com os seus gemidos de dor, que era mais intensa nela do que em outras mulheres, em razão de sua pouca idade. Num dado momento, seus gemidos cessaram. O que se ouvia agora era som desejado por todos que ali estavam: o choro de uma criança. A parteira vai até a porta do quarto em que se encontrava em reservado com Vovó e anuncia: “É uma menina”. Um misto de alegria e alivio tomou conta de todos os presentes. Vovô era abraçado e cumprimentado. O farto jantar teria um sabor diferente, um motivo a mais para reunião da família. Enquanto o sol se punha no horizonte, as lâmpadas a carbureto eram acesas e o sino da Igreja São Francisco anunciava a Ave Maria. Ao fim daquele dia tão especial, não havia nenhuma nuvem, revelando um céu estrelado e uma lua crescente, em seus últimos dias, cuja luz se refletia nas águas do rio, tornando a noite ainda mais suave e bela. As famílias Sabóia Ximenes de Aragão, Pereira Mendes e Cavalcante possuíam agora um novo membro. Enquanto Vovó, sob cuidados, ainda se convalescia do esforço próprio dos partos, Vovô fumava um charuto e comemorava junto com os parentes e amigos o nascimento de sua primeira filha. No domingo seguinte, dia 14, seria dia de São Joaquim, patriarca da família. Esta data viria a ser no futuro, mais precisamente no ano de 1953, instituída como o Dia dos Pais. Entretanto, naquele domingo, o casal comemorou junto com tantos outros, por que agora formava de fato, ao lado de sua filha, uma nova família, a família Cavalcante Mendes.

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Olga com alguns meses de vida

Tanto Vovô quanto Vovó, tinha origem em famílias católicas. A criança deveria ser batizada com um nome que lembrasse esse fato, mas que ressaltasse também sua delicadeza e, ao mesmo tempo, fosse a marca de seu caráter. Alguns dias depois de seu nascimento, a linda menina foi batizada com o nome de Olga Maria Cavalcante Mendes (o nome Olga tem origem nórdica e significa “Santa”), à qual me referirei carinhosa e respeitosamente como “Mamãe”.

Em outro ponto do Nordeste, Mossoró, no Rio Grande do Norte, já se destacara no século XIX por ter alforriado todos os seus escravos em 1883, cinco anos antes da promulgação da Lei Áurea.

Em 1918, a Europa começava a sua recuperação, após o fim da Primeira Grande Guerra, a qual ceifou a vida de oito milhões de pessoas. A necessidade por alimentos e produtos industrializados nesse processo era imensa. Assim, países com a característica do Brasil se tornaram grandes fornecedores. O Nordeste, em particular, se beneficiava da proximidade de seus portos com a Europa e de uma razoável estrutura logística, o que resultou em um incremento de seu comércio de uma forma geral.

Apesar de a “gripe espanhola” ter assolado o país no período pós-guerra, incluindo esse município ascendente, na década de 20 do século XX Mossoró fervilhava. Corria a notícia pelo Brasil inteiro da resistência do município ao ataque do lendário cangaceiro Lampião no dia 13 de junho de 1927. O ataque, que durou cerca de uma hora e meia (iniciou-se às 4 horas da tarde e terminou às 17 horas e 30 minutos, com os cangaceiros batendo em retirada). Tio Cornélio (Manoel Cornélio de Aragão Mendes), um dos irmãos de Vovô, foi um dos heróis da resistência, entrincheirando-se no Prédio dos Correios para o combate.

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O cangaceiro “Jararaca”, ladeado por dois soldados.

O cangaceiro “Jararaca”, ferido (na perna e nas costas) e preso durante a batalha, acabou sendo morto cinco dias depois de maneira cruel (os soldados que o conduziam em uma carroça, pararam em frente ao cemitério, onde já havia uma cova aberta. O retiraram da carroça e jogaram no chão, atingindo-o com coronhadas, principalmente na cabeça. Ao atirá-lo na cova, viram que esta era menor que ele. Com pás e picaretas, lhe quebraram as pernas, verificando então, pelos gemidos, que ele ainda estava vivo. Mesmo assim, cobriram-lhe de terra.). Por causa desse imenso sofrimento que caracterizou sua morte, ainda hoje “Jararaca” é venerado por diversas pessoas que lhe atribuem inclusive milagres.

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Estação Ferroviária de Mossoró. Fundamental na batalha contra Lampião e para o seu desenvolvimento.

Ainda neste ano, a mulher conquista o seu direito ao voto, como registra o sitio da “Folha Online”(4):

“O direito ao voto feminino começou pelo Rio Grande do Norte. Em 1927, o Estado se tornou o primeiro do país a permitir que as mulheres votassem nas eleições.

Naquele mesmo ano, a professora Celina Guimarães - de Mossoró (RN) se tornou a primeira brasileira a fazer o alistamento eleitoral. A conquista regional desse direito beneficiou a luta feminina da expansão do “voto de saias” para todo o país.”

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Assim descreve Raul Fernandes a Mossoró da segunda metade dos anos vinte (3):

“Nos idos de 1927, Mossoró competia com a capital do Estado do Rio Grande do Norte. A população, incluindo a do município, somava 20.300 almas. A de Natal alcançava 30.600. (…) Ligada ao litoral por estrada de ferro que se estendia ao Povoado de São Sebastião, atual Dix-Sept Rosado, na direção oeste, percorrendo quarenta e dois quilômetros. Estradas de rodagem convergiam de vários recantos, sulcadas por caminhões que, aos poucos, substituíam as bestas de carga.”

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Indústria M.F. Monte

“Possuía o maior parque salineiro do país. Três firmas descaroçavam e prensavam algodão. Centro comprador de peles, algodão e cera de carnaúba. Exportava pelo porto de Areia Branca. Longos comboios de mercadorias chegavam pelo interior da Paraíba e do Ceará. Voltavam levando sal e variados produtos. A energia elétrica alimentava várias indústrias nascentes. Havia repartições públicas federais e estaduais. A agência do Banco do Brasil era o único estabelecimento de crédito da região.”

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Praça Rodolfo Fernandes (atual) em 1915

“Circulavam três jornais: “O Correio do Povo”, o “Nordeste”, e “O Mossoroense”, o mais antigo do município, fundado em 1872.

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Diocesano Santa Luzia e Sagrado Coração de Maria

Existiam dois estabelecimentos para ensino secundário – a Escola Normal e a de Comércio. Dois colégios com internato – o Diocesano Santa Luzia para rapazes, e o Sagrado Coração de Maria, dirigido por religiosas franciscanas, portuguesas, para moças.”

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Praça Vigário Antonio Joaquim

Por influência de Victor de Paula Pessoa (Tio), marido de Tia Marieta (Maria de Aragão Mendes, nome de solteira), Tio Humberto (Humberto de Aragão Mendes) seguiu para Mossoró em 1922, para lá firmarem-se como representantes comerciais. Há informações que Tio Humberto, na verdade, teria chegado à Mossoró em 1919 e que, em seguida, teria trazido seus irmãos (Tio Cornélio, Tio Amarú e Vovô). Tio Humberto casou-se em Mossoró com Tia Odete (1925) e Tio Cornélio casou-se com Tia Moça (Joaquina Leite Mendes). Os dois se beneficiaram muito desse áureo período econômico. Tio Humberto tinha um tino comercial muito apurado (“possuía uma enorme facilidade para encontrar soluções para os problemas que surgiam”, segundo relata a prima Aída, sua filha) e construiu uma sólida estrutura.

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Rua Meira e Sá

Depois do nascimento de mamãe em 1927, Vovô e Vovó também seguem para Mossoró. Vovô ia tentar se firmar como representante comercial naquela região. No início obteve um relativo sucesso. Adquiriu uma casa e fixou residência. Com a Europa quase reconstruída, o entusiasmo do início da década dava sinais de preocupação, embora a cidade ainda permanecesse aquecida economicamente. Foi em Mossoró que mamãe deu seus primeiros passos e falou suas primeiras palavras. No ano seguinte, nasce o segundo filho do casal, Tio Assis. A Grande Depressão, com início em 1929 e fim em 1933, trouxe reflexos terríveis para a economia em todo o mundo e movimentos sociais em busca de alternativa ao capitalismo surgiam em toda parte. O foco deixa de ser econômico e a passa a ser político. Por essas e outras razões os negócios de Vovô não iam bem. Vovô e Vovó permanecem pouco tempo em Mossoró (cerca de três anos), retornando a Sobral, onde recebeu de Vovô Enéas uma parte da fazenda, a qual deu o nome de “Jacaúna”, que possuía uma pequena casa, na qual viveria por alguns anos.

Nas proximidades existiam outras casas de propriedades dos outros filhos do Cel. Enéas. A de Tio Antonio Enéas (casado com Tia Gilda) era “Eneápolis”. A de Tia Fransquinha (casada com Tio Potiguara) era “Ipanema” e a de Tio Amarú (casado com Tia Maria) era “Barraca”. Incluindo o “Estreito”, todas formavam uma única e imensa propriedade, ladeando a margem direita do Rio Acaraú. Para se ter uma idéia, a plantação de cajueiro ocupava uma légua quadrada (algo em torno de 4000 ha). Também se plantava milho, feijão e algodão. Havia a criação de gado de corte e leiteiro. Toda essa estrutura era sustentada por empregados que residiam na propriedade.

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A “Barraca” em 2008

Quando Vovô retornou para a “Jacaúna”, era necessário reformar e caiar a casa. Nesse curto tempo, mamãe e Tio Assis ficaram na “Ipanema”, casa de Tia Fransquinha. Observar o que os empregados faziam, era um dos passatempos deles. Na casa de Tio Antonio Enéas, trabalhavam D. Izabel e sua filha Raimunda (Mumunda) que, por sua vez, era casada com Seu José Jerônimo (Janjão). Eram eles que cuidavam de todas as lides da casa.

No “Estreito”, trabalhavam Sinha Sinhá, uma senhora de idade já avançada e que era a cozinheira. Filomena Nazara era uma ex-escrava que produzia louças de barro. Mamãe e Tio Assis passavam horas observando D. Filomena, enquanto esta trabalhava em seus artesanatos. As vezes até “ajudavam” no trabalho. Lá trabalhavam ainda o Chicão, casado com Raimunda e seus filhos Filomeno, Chicão Filho e Maria.

É dessa época o seguinte causo:

“Certa vez - narra Mamãe – íamos eu e o Papai do Estreito para a Jacaúna. Papai tinha um cachorro muito bom de caça que se chamava “Gigante”. Papai carregava uma foice e caminhava na minha frente por uma pequena trilha no meio do mato. No lado direito da trilha havia um pequeno barranco. Em certo momento, “Gigante” começou a latir. Papai achou que se tratava de uma caça (um Tatu, talvez) e correu para onde ele estava. “Gigante” estava parado, latindo e balançando o rabo à frente do pequeno barranco, onde existia um buraco. Papai se agachou e começou a cutucar no buraco com a foice. Eu subi no barranco e fiquei também agachado em frente a Papai, observando o que ele fazia. Foi quando Papai olhou em minha direção e, repentinamente e sem que eu imaginasse o que estava acontecendo, ele se levantou, me segurou pelo braço e me atirou no meio da trilha. Sem entender nada, comecei a chorar, não só pelo enorme susto, mas também pelos arranhões que sangravam um pouco e ardiam muito. Quando olhei para ele novamente, ele estava dando o último golpe de foice numa cobra Cascavel que estava bem ao lado de onde eu me encontrava e pronta para dar o bote.”

Os primeiros anos de escolarização de mamãe e Tio Assis foram ministrados por Vovó. Foi ela quem os alfabetizou e ensinou a fazer as operações básicas de matemática. Aliás, Vovó alfabetizou vários de seus sobrinhos que moravam na propriedade. Vovó era afetuosa e muito zelosa em relação a eles. Cuidava-lhes da aparência, da higiene e da formação. Permitia que tivessem liberdade para brincar, mas também cobrava as suas responsabilidades, principalmente em relação aos estudos. Além disso, Vovó dava seus primeiros passos como coreógrafa e diretora de espetáculos. Foi o período em que mamãe e Tio Assis tiveram mais convivência com Vovô Enéas e Vovó Regina. Lembro-me que quando se encontravam, conversavam muito sobre “aquele tempo”. Como mamãe diz, “o Assis fantasiava muito as histórias para parecerem melhores do que foram realmente.”

Mamãe guarda boas lembranças de Vovô Enéas: “Vovô era uma pessoa tranqüila e bem educada. Tratava-me com muito carinho e brincava muito comigo”. Tio Assis contava que ele o tratava por “Capitão Assis” e que gostava de mandá-lo fazer serviços que incluíam montar a cavalo. Ele guardava um enorme carinho dessa relação. Quanto a Vovó Regina, eles diziam que era uma boa pessoa, mas que gostava de guardar certa discrição em relação aos seus sentimentos. Esse comportamento, aliás, foi transportado, de alguma forma, para alguns membros das gerações posteriores.

As brincadeiras eram típicas de quem mora na zona rural e incluíam banho em um córrego de água cristalina, cuja nascente ficava dentro da propriedade, capturar insetos da região, em especial o Mané-magro, esconde-esconde, passear a cavalo, atirar comida para as galinhas, entre outras.

“Papai – relata mamãe – preparava uma iguaria que ele chamava de “Tiquara”. Era feita assim: primeiro ele ralava rapadura bem raladinha e colocava no prato. Depois colocava farinha e água e misturava tudo. A gente adorava aquilo e sustentava, viu?”

Vovô também gostava de brincar com eles e de contar muitas histórias. Colocava-os na rede e balançava até que adormecessem. Costumava passear pela fazenda com eles em companhia de Vovó. Iam para a parede do Rio para observar as Jaçanãs ou coisas do tipo, ou levá-los para visitar os tios e avos. Mamãe não se lembra de uma única vez que sua avó Regina tenha lhes feito uma visita.

A região possuía uma vegetação típica muito bonita, que incluía a Carnaubeira ao longo de toda a margem do Rio Acaraú. Para utilização nas construções do local, foram plantadas mudas de Bambu. No fim do dia, quando o sol se punha atrás da Serra da Meruóca, refletindo seus raios nas águas do rio, impedidos pela vegetação, formava um quadro natural admirável, capaz de encantar a quem contemplasse.

Havia uma prima de Vovô chamada Gerviz Mendes Frota (casada com José Frota), cuja filha foi a catequista de mamãe e, provavelmente, de Tio Assis. Mamãe fez sua Primeira Comunhão em Sobral.

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Quando conheci Vovô, ele já tinha mais de sessenta anos e Vovó mais de cinquenta. Vovô era muito organizado com suas coisas. Tirava sua barba seguidamente e gostava sempre de estar bem vestido. Gostava muito de conversar sobre qualquer assunto. Era um homem simples, de muita personalidade e suas atitudes, que faziam parte de sua natureza extremamente positiva e prática, geravam situações muito engraçadas. Em cada uma delas, Vovó se escandalizava, dada a sua extrema educação e delicadeza. Meu irmão Carlos narra pelo menos três dessas situações. Diz ele:

- Certa vez, Tio Zé Vidal tinha ido para Tibau, onde toda a família já se encontrava. Tio Zé Vidal era muito distraído e, ao chegar lá, Tia Leda lhe perguntou pela carne que ele havia ficado de levar quando fosse. Tio Zé Vidal não se alterou, embora o fizesse com facilidade. Foi até a saída para Mossoró e pediu para alguém que para lá retornava levar um recado, pedindo para Vovô comprar a carne e enviar por alguém que fosse para Tibau. Vovô morava em uma casa na saída para Tibau, próxima à Estação de Trem.

Assim fez Vovô e ficou esperando passar alguém que fosse para Tibau. Cada um que passava ele estendia a mão e quando a tal pessoa parava ele perguntava: “Você vai pra Tibau?” E continuou até que alguém respondeu que iria. Era alguém desconhecido de Vovô, mas que o conhecia. Segue-se o seguinte diálogo:

- Pois não Seu Bias, o que que o senhor precisa?

- Você conhece Zé Vidal?

- Sim, conheço Seu Bias.

- Você pode levar essa carne pra ele?

- Claro Seu Bias, posso sim.

- Agora é o seguinte, me pague aí a carne e receba dele quando chegar lá!!

Muitos anos mais tarde, quando já morava em Recife, em um apartamento no Bairro de Boa Viagem, existia uma vizinha que gostava muito de Vovó, tinha muito carinho por ela e tudo fazia para agradá-la. À tarde, bem na hora do café, a campainha toca e Vovó vai atender. Era a vizinha com um cuscuz que havia acabado de fazer em um recipiente apropriado:

- Olá Dona Walda, boa tarde! Fiz esse cuscuz pra senhora.

Quando a vizinha já passava o cuscuz para as mãos de Vovó, ouviu-se a voz de Vovô, que se aproximava das duas dizendo:

- Quem é Walda?

- É Dona Fulana Bias.

- E o que é isso aí?

- É um cuscuz que ela fez pra gente.

- Walda, você num come isso, porque lhe faz um mal horrível. Eu também não posso comer.

E pegando o cuscuz da mão de Vovó, já foi entregando pra vizinha dizendo:

- Tome Dona Fulana, leve seu cuscuz porque aqui ninguém vai comer ele não. Pegue, tome...

E Vovó:

- Bias, pelo amor de Deus, o que é isso? O José gosta...

- Não Walda, o José num gosta disso não. O José tem horror a cuscuz...num adianta não, aqui ninguém vai comer não, vai é estragar e vai acabar indo é pro lixo...pegue, leve.

- Ô minha filha, desculpe viu? Fico muito agradecida, obrigada... – dizia Vovó sem saber onde enfiar a cara – Ave Maria!!

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Vovó compôs algumas peças ao piano. Meu irmão Carlos conseguiu com uns amigos dele, um gravador para guardar essas peças. Montaram tudo e alertaram que precisava de silêncio, caso contrário, a gravação sairia com defeito. Isso ainda no mesmo apartamento. Então Vovó disse:

- Bias, por favor, não faça barulho enquanto eu tiver tocando. Está gravando...se não vai atrapalhar.

Vovô tinha uma resposta que sempre dava nessas situações:

- Hum!

Quando Vovó estava na metade da primeira peça, ouviu Vovô perguntar lá do quarto:

- Ô Walda, tu sabe se o José vai demorar?

Vovó parou de tocar e disse quase implorando:

- Bias, está gravando Bias. Pelo amor de Deus, num fale não!!

Tudo pronto outra vez. Vovó recomeçou a peça. Quando já estava no quase no fim, ouve de lá:

- Walda, vai demorar muito. O Naninho (o apelido de meu irmão Carlos) precisa ir embora!

Vovó parou de tocar outra vez, levantou-se, foi até o quarto e esbravejou:

- Bias, você estragou a gravação outra vez. Bias, pela última vez, pare de falar, se não eu vou perder a paciência.

Vovó começou pela terceira vez. José (meu primo, filho de Tia Walbia, que foi adotado por eles após a morte dela) tinha um passarinho em uma gaiola que ficava na parte do fundo do apartamento. Lá pela metade da peça, o passarinho começou a cantar pausadamente:

- Piu...piu...piu...piu

Mas Vovó não parou. Achou até bonito aquele canto ao fundo. De repente, Vovô grita lá do quarto:

- Sou eu não, viu Walda? É o passarinho do José...

Lembro-me que ele gostava de acordar muito cedo (nunca depois das cinco horas da manhã) e tomar banho de caneca nos tonéis no fundo da casa. Tomava seu café da manhã. Por volta das nove horas da manhã, Vovó, que dava aula de piano, lhe preparava o seu almoço, que era sempre o mesmo: arroz branco, um grande bife mal passado e farinha, tudo regado a um molho de pimenta malagueta que ele mesmo preparava. Ao lado do prato, duas bananas que acompanhava a refeição. Por fim, às seis horas da tarde ele tomava sua coalhada e por volta das oito horas já se recolhia.

Assim era Vovô que eu conheci.

A vida de Vovó, mamãe e Tio Assis nessa época e dos outros filhos mais tarde, entretanto, não foi nada fácil. O alcoolismo, contra o qual Vovô lutou durante grande parte de sua vida, foi responsável por vários acontecimentos desagradáveis, os quais não valem à pena serem mencionados. Além disso, o impediu de ser abastado como a maioria de seus irmãos. Isso o excluiu, de certo modo, do convívio familiar. Não foram poucas as oportunidades desperdiçadas. O equilíbrio e a paz só vieram alguns anos depois, com uma breve recaída por ocasião da trágica morte de Tia Walbia. No entanto, jamais conseguiu acumular bens.

Por volta de 1934, pelo mesmo motivo, Vovô precisou ser levado para Fortaleza, onde passaria por um longo tratamento. Um primo de sua mãe Regina, era médico e acompanhou seus exames e tratamento. Verificou que o álcool tinha, sobre Vovô, um efeito diferente das outras pessoas. Ele era capaz de lhe causar transtornos de comportamento que se assemelhavam, em certas circunstâncias, a loucura. Vovó e as crianças ficaram na casa de Tio Aristóbulo. Enquanto Vovô se encontrava internado, Vovó estudava, preparando-se para prestar um concurso para Agente de Saúde Pública do estado. Vovó foi aprovada e tomou posse de sua função na cidade de Baturité, próximo a Fortaleza. Mamãe, então com 8 para 9 anos, lembra-se que morava em uma rua, na qual todas as casas possuíam um parreiral no quintal. Mamãe começou a estudar em uma pequena escola de lá.

Próximo ao Natal de 1936, mais precisamente no dia 10 de dezembro, nasceu Walbia Cavalcante Mendes, a segunda filha do casal. Mamãe agora dividia seu tempo entre escola, brincadeiras e ajudar a Vovó a cuidar do novo bebê.

Por conta da profissão e de seu temperamento gentil e agradável, Vovó era muito querida por todos na cidade. Mamãe se lembra que havia um casal que, particularmente, era muito atencioso e carinhoso com Vovó e sua família. Era Seu Luiz Américo, que era chefe da Estação do Trem, e sua esposa Maria José. Estavam sempre dispostos a ajudar no que fosse preciso.

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Estação Ferroviária de Baturité (1900)

Por volta de 1938, Vovó foi transferida para prestar serviço em Crateús/CE. Era necessário, entretanto, um tempo para se estabelecerem. Foi então que mamãe, então com 11 anos, voltou para Sobral e ficou morando com Tia Fransquinha, esposa de Tio Potiguara, na casa da cidade, que era bem próxima ao Colégio Santana, onde estudou “em uma sala situada no segundo andar”, lembra ela. Nesse período, conviveu com seus primos mais novos: Manoel Artur (6 anos), Tereza Maria (3 anos) e Raimundinha (2 anos).

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Ariane (prima, filha de Tio Aristóbulo), Olga, Arimar (primo, filho de Tio Aristóbulo)) e Tio Assis

Nos finais de semana, mamãe ia para o “Estreito”, as vezes com Vovô e Vovó, quando iam por lá. Mamãe tinha uma voz afinada e cantava muito bem. Tanto que D. José Tupinambá da Frota, irmão de Tio Potiguara, lhe pedia para cantar, quando o ia visitar. Quando calhava de estar Vovó por lá, ela a acompanhava ao piano. Cantar foi algo que mamãe sempre gostou e o faz muito bem até hoje, principalmente as músicas românticas dos cantores famosos da época e de épocas posteriores, todas carregadas de muito sentimento.

Em 1939 nascia em Crateús, Tia Leda (Leda Cavalcante Mendes, nome de solteira), a irmã mais nova de mamãe. Vovó já montava seus espetáculos, que incluíam teatro, balé e música. Algumas delas foram: La Gioconda, As Gueixas, Dança das Horas e Jesus.

Voltando para Crateús, mamãe continuou seus estudos na Escola Normal, concluindo o que hoje corresponde ao Ensino Médio, suficiente para as mulheres da época. Lá residia um primo de Vovô, Olavo Frota, que era juiz de direito. Nesse período, mamãe conviveu com seus primos Omar, Oscarina, Omarina e Ossian, todos filhos do casal. Este último era o único que sabia patinar e costumava fazê-lo por longas horas na praça da cidade juntamente com mamãe.

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Mamãe também participava nas montagens que Vovó fazia, ora atuando, ora cantando. Era muito admirada pela população local por seu talento nas artes.

Em 1942, nasceu Francisco Cavalcante Mendes, o filho mais novo do casal. Por volta de 1943, Vovó foi novamente transferida por conta de seu trabalho. Desta vez para Aracati, cidade que fica entre Fortaleza e Mossoró. Tio Assis, então com quinze anos, tinha ido morar em Fortaleza com Tio Aristóbulo, para estudar e fazer curso técnico. Acabou se tornando um grande “companheiro” de Tio Aristóbulo, que gostava da boemia, como se dizia na época.

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Aracati da época

Em Aracati havia uma senhora, D. Castorina, que gostava de colocar apelido em todas as pessoas que conhecia. Quando Vovô e Vovó se mudaram para lá, Tio Assis foi lhes fazer uma visita e lá havia um cinema que fazia mais de um ano que não exibia nenhuma sessão, em razão de certo equipamento defeituoso. Como Tio Assis era muito curioso, habilidoso e já possuía algum conhecimento, acabou por concertar tal equipamento, fazendo com que o cinema voltasse a funcionar. De D. Castorina ganhou o apelido de “Grilo Elétrico”. Nos desfiles e cerimônias que aconteciam eventualmente, aqueles oficiais fardados, também eram alvos de suas observações. Um tenente virou “Bolo Enfeitado”. Mamãe era caprichosa no seu vestir. Gostava de andar sempre “bem arrumadinha”, como ela diz, sem luxo, de forma simples, mas com capricho. Por causa disso, ganhou a alcunha de “Rainha da Moda”. Era então uma mocinha, com idade entre quinze e dezesseis anos. Gostava muito de ler romances de José de Alencar e Machado de Assis, assim como livros de bolso, principalmente do autor Marcial Lafuente Stefania.

Com a proximidade de Aracati e Mossoró, Vovô retoma o contato com seus irmãos Marieta, Amarú, Cornélio e Humberto. A possibilidade de retorno para Mossoró era, a cada dia, maior. Particularmente, a Segunda Grande Guerra havia, assim como a primeira, estimulado o comércio na região. Desta vez, Natal possuía uma base do exército americano, pela mesma razão da anterior, a proximidade com a Europa. Em termos de logística, a base era essencial. No final de 1944 ou início de 1945, Vovô e Vovó retornaram para Mossoró. Lá, com a ajuda de Tio Humberto (“Foi uma ajuda pequena, mas fundamental para reerguer papai” – conta Tio Francisco – “principalmente porque Tio Humberto impôs a condição a papai de que só o ajudaria de ele nunca mais tocasse em bebida, o que de fato aconteceu.”). Vovô abriu um comércio de peças de automóveis, que recebeu o nome de “Porta Larga”, por possuir somente a porta da frente.

Tio Francisco lembra, inclusive, que havia uma música, uma espécie de “jingle”, que foi criado por Vovó como forma de propaganda. Deste “jingle”, ele lembra-se apenas de uma pequena estrofe:

“Salve, salve D.Walda, o Seu Bias, a Leda e a Walbia, Donos dá porta larga,

Salve D. Walda, o Seu Bias, a Leda e a Walbia.”

Segundo ele, “é um dobrado de banda de música.”

E foi assim que Vovô e Vovó se tornaram conhecidos na cidade e ganharam definitivamente o respeito e o carinho das pessoas.

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José Leão (1941)

José Arset Leão de Moura (o qual chamarei de Papai) nasceu em 18 de abril de 1923. Era filho de Raimundo Leão de Moura (Vovô Raimundo, nascido a 22 de agosto de 1876), um comerciante de algodão, que havia sido suplente e vereador por duas legislaturas seguidas, respectivamente, e um dos heróis da Resistência de Mossoró ao ataque de Lampião, ficando entrincheirado na Estação Ferroviária, próxima à sua casa, e Francisca Melania de Moura (Mãetinha, nascida a 10 de setembro de 1884), os quais eram primos. A família era natural de Patú/RN.

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Papai em Recife, em companhia de José Leite.

Em 1945, Papai era aluno de Medicina em Recife/PE e reservista. Desde muito cedo, aprendeu a jogar e a amar o futebol. Foi nessa época que Papai foi eleito “O craque mais querido do Recife”, promoção feita pelo “Jornal do Commercio de Recife”.

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Equipe do Náutico em 1945/1946

Depois que terminou sua faculdade em Recife, Papai fez especialização em Cardiologia, em Salvador/BA. Durante as férias, Papai ia para Mossoró, onde tinha vários amigos, entre eles, Francisco Nogueira do Monte (Chico Monte), que viria a ser o marido da prima Neide, filha de Tio Humberto. Aliás, Chico Monte e Neide eram primos legítimos.

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Papai sempre foi muito vaidoso, especialmente em sua juventude. Por volta dos 17 anos, começou a cultivar um bigode que o acompanhou até a sua morte em 14 de julho de 1987. Em companhia dos amigos, freqüentava os clubes e bailes de Mossoró e era um sedutor incorrigível. Gostava das noitadas e de política.

O fim da Segunda Grande Guerra se aproximava. Havia no ar um clima de euforia e alívio. Mamãe então estava com dezessete para dezoito anos quando foi para Mossoró. A vida financeira de Vovô dava sinais de estabilidade.

O Repórter Esso havia iniciado sua transmissão em 1941 e transmitia notícias da Segunda Guerra e do “modo de vida americano”, que influenciaria definitivamente o comportamento das pessoas no país inteiro.

As vozes das canções interpretadas por Orlando Silva, Chico Alves, Silvio Caldas, Dalva de Oliveira, Nelson Gonçalves, Carmem Miranda, entre outros, cruzava, o ar através das ondas sonoras das rádios e invadiam os corações de moças e rapazes.

Canções como “A deusa da minha rua” (1940), “Marina” (1947), “Eu sonhei que tu estavas tão linda” (1942), “Atire a primeira pedra” (1944), “Caminhemos” (1947), “Amélia” (1941), “Camisa Listrada” (1937), além dos boleros como “Perfídia” e tantos outros, favoreciam o clima de romance que aproximava moças e rapazes.

O convívio com a da família, aliada a sua imensa alegria e delicadeza, fez com que mamãe tivesse uma vida social bastante agitada. Mamãe jogava tênis, na maioria das vezes com Rute. Participava da equipe de vôlei do Potiguar, das peças de teatro que Vovó montava, e não foram poucas. Gostava de tocar violão e cantar e freqüentava bailes do Clube Ipiranga.

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Vôlei, Tênis e Teatro em companhia de Rute, sua amiga.

Rute era namorada do primo Eider, filho mais velho de Tio Humberto. Por conta disso, mamãe cultivou com ela uma grande amizade. Era parceira em várias atividades, incluindo o tênis, o vôlei e o teatro, mas não ia aos bailes, porque seus pais não permitiam. Mamãe, porém, que gostava muito de dançar, segundo ela própria, “não perdia um”.

Rute conta que as partidas de tênis pareciam mais com um ping-pong numa grande mesa do que propriamente numa quadra. Mas era muito divertido. Hoje, seus filhos e netos são ótimos jogadores de tênis.

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Mariza e Olga em Mossoró

A prima Mariza, filha de Tio Cornélio e Tia Moça, conviveu com mamãe em vários momentos da vida dela, a começar pelo “Estreito”, de onde não possui quase nenhuma lembrança. Sobre o tempo de convívio em Mossoró, Mariza narra assim:

- Quando Tio Bias chegou a Mossoró, acho que em 44 ou 45, já havia superado o problema do alcoolismo. Tanto ele quanto Tia Walda, eram pessoas muito gentis e cativantes.

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Talvez por conta das atividades de Tia Walda, ligadas à música, dança e teatro, a Olga era moça muito alegre, extrovertida, tocava violão e cantava. Aonde ela chegava, animava o ambiente. Tia Odete achava lindo quando ela sapateava. Ela sapateava também, sabia? Era uma moça bonita, esbelta, gostava de vestir-se bem, de arrumar o cabelo, era vaidosa também. Contava histórias engraçadas e dávamos muitas risadas.

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Cine PAX em 1945

Mamãe também gostava muito de cinema. Entre os que ela mais cita estão “Morro dos Ventos Uivantes”, “Casablanca”, “...E o vento levou”, “O Mágico de Oz”, “No tempo das diligências” e outros mais. Atores e atrizes como Humphrey Bogart, Ingrid Begman, Clark Gable, Olivia de Havilland, Laurence Olivier, Merle Oberon, John Wayne, Fred Astaire, Ginger Rogers e tantos outros, fazem parte de sua memória.

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Mas nenhum ocupa tanto espaço como Shirley Temple, de quem mamãe é, ainda hoje, uma admiradora:

- Eu ficava impressionada. Como é que podia uma menina tão pequena ser tão habilidosa para dançar e interpretar to bem – diz mamãe.

Mamãe apagou de sua memória, consciente ou inconscientemente, muitas passagens de sua vida. Ela não se lembra, por exemplo, em que circunstâncias conheceu Papai. Mas, é possível estimar que entre namoro e noivado tenham se passado, seguramente, mais de quatro anos. Ele era ainda estudante de medicina na Faculdade de Medicina de Recife quando se conheceram e se casaram apenas quando ele terminou sua Residência em Cardiologia em Salvador/BA.

As fotos abaixo pertenciam a Papai e no verso dela, contém recados de mamãe pra ele.

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“Esta foi na hora que recebi o teu último telegrama. Quando eu

estava lendo, Neide bateu, de propósito.”

Ao lado de mamãe, Tia Leda.

Sobre este período, Mariza relata:

- Quando Olga começou a namorar com Zé Leão, ela começou a mudar, mas mudar muito. Transformou-se. É claro que também ela estava amadurecendo, não é? Mas, aquela menina alegre e expansiva, foi sendo paulatinamente substituída por uma moça séria, de pouco convívio, que não procurava mais ninguém. Foi, de certa forma, se isolando. Eu conheci Zé Leão nessa época. Ele era uma boa pessoa, educado, cortês, mas era extremamente ciumento. Acho até que de forma doentia e Olga aceitava isso. Sabe por quê? Porque tanto ela era apaixonada por ele, quanto ele era muito apaixonado por ela. Essa mudança de comportamento da Olga era visível.

Tio Bias via isso. Achava que ela estava apaixonada, mas não estava feliz. Ele e Tia Walda começaram a ficar preocupados com ela e a aconselharam muito para que não se casasse com ele se não tivesse muita certeza que era isso que ela queria. Teve uma vez até, que ele propôs dar uma passagem a ela passear no Rio de Janeiro (que era um presente fabuloso na época), se ela resolvesse não casar com Papai. Mas não fazia isso porque não gostasse de Zé Leão não. Era porque achava que a Olga não estava feliz e que não ia ser feliz depois de casada. E estava certo, não foi?

No dia 19 de novembro de 1951, Papai e Mamãe se casaram. Foram testemunhas do casamento Tia Sergina e Tio Arnóbio, Tia Heloisa, Tio Evilásio e Tia Fransquinha, a prima Neide e Chico Monte, Tia Odete e Tio Humberto, Vovô Raimundo e Mãetinha, Vovô Bias e Vovó Walda, entre outros. Declarou-os casados, o Juiz Dr. Zacarias Gurgel Cunha. Isso foi registrado no Cartório da 1ª Zona de Mossoró.

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Mamãe e Papai de braços dados.

Em 08 de setembro de 1952, nasceu José Wilson Mendes Leão, meu irmão mais velho. Em seguida, a 15 de julho de 1953, nasceu meu irmão Carlos Ernani Mendes Leão.

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Minha irmã Maria do Socorro Mendes Leão, nasceu a 07 de julho de 1954, enquanto minha irmã Regina Ângela Mendes Leão, nasceu a 19 de agosto de 1955. Portanto, mamãe passou os quatro primeiros anos de casamento, praticamente grávida. Depois de um intervalo de dois anos, nasceu minha irmã Tereza das Graças Mendes Leão, a 12 de novembro de 1957. Mais dois anos e nasceu minha irmã Lana Mara Mendes Leão, a 21 de outubro de 1959.

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Por fim, nasci eu, a 01 de setembro de 1961. Foram sete filhos em nove anos de casamento. Nos intervalos, conta mamãe, havia os bailes, as viagens a Tibau, os passeios pela cidade, entre outras atividades.

À medida que o tempo foi passando, no entanto, as interferências externas foram aumentando, mais enfaticamente por parte da família de papai (Tia Sergina, Tia Abigail, Tia Heloisa, principalmente), motivadas por interesses que nos são desconhecidos e talvez nunca o saibamos. As restrições impostas ao comportamento de mamãe e sua vida social, inclusive com a própria família, também foram sendo ampliadas. Aos poucos a relação do casal foi ruindo e os sentimentos sendo substituídos.

Mamãe havia sido educada, assim como a maioria das mulheres de sua família e das mulheres da época de um modo geral, para ser uma boa esposa, boa mãe, mas não para “trabalhar fora”, ou seja, para ganhar seu próprio dinheiro. Isso, de certa forma, criava uma dependência financeira da esposa com o marido. A sociedade da época aceitava isso e considerava um “bom casamento”, quando a moça se unia a alguém capaz de lhe dar e aos seus filhos um bom padrão de vida. A separação ainda era um tabu e as mulheres nessa condição eram, na maioria das vezes, alvo de preconceito. Quando acontecia, o melhor era ir para outro lugar, outra cidade.

Papai, por sua vez, tinha um único inimigo: o tempo. Foi ele que lhe tirou a alegria de jogar futebol. Foi ele que levou seu pai, seus irmãos, que foi, aos poucos, lhe tirando o viço da juventude, a resistência e a disposição. Acreditou, em vão, que com ajuda de suas irmãs, podia parar o tempo, que tudo podia voltar a ser como antes. Em vão. Aos poucos foi esquecido por elas. Só tardiamente percebeu suas reais intenções. Não viu a renovação da vida e a alegria dos filhos formados apesar de os amar muito. Não viu os netos crescerem. Não viu a velhice chegar ao lado de uma mulher dedicada, apaixonada e de muita fibra.

Assim, mamãe e os sete filhos foram para Fortaleza em 1967 ou 1968. Foram sete anos de imensas dificuldades, mas que sedimentou definitivamente a nossa união que perdura até hoje. Mas mamãe fez uma opção: seus filhos. Essa opção é a razão maior de minha mais profunda admiração por ela. Investida de um profundo amor próprio e de uma personalidade incontestável, só presente nas grandes mulheres, mamãe enfrentou toda sorte de dificuldade, mas seguiu em frente, com a certeza de que tudo isso seria transitório, que passaria. E passou.

Em Fortaleza, mamãe tinha vizinhas excelentes com as quais cultivou amizade. Além disso, várias primas e primos lá residiam, tanto do lado de Vovô, como Eider e Rute, Neide, quanto do lado de Vovó, como João Eudes, Maria Luiza e Iacira. Essas pessoas foram essenciais nessa época. Os quatro irmãos mais velhos, José Wilson, Naninho, Socorro e Regina, embora jovens, trabalhavam e sustentavam a casa, enquanto os mais novos, TT, Lana Mara e eu, ajudávamos na arrumação e nos afazeres diários. Todos estudavam.

Meu convívio com papai foi muito pequeno. Ocasionalmente ele ia à Fortaleza para visitar os filhos, mas não ficava em nossa casa. Lembro-me dele contando piadas e rindo, com uma gargalhada contagiante, durante quase todo o tempo que durava o nosso encontro. Durante esse tempo, seguidas vezes íamos para Mossoró para passar as férias. Em geral, ficávamos na casa de Tia Leda. Eu gostava muito porque tinha os primos Marcelo, Marquinho e Max  com quem brincava muito e ainda as primas Mônica, Miriam e Jaqueline para brincar com Lana Mara e TT. Quase sempre íamos para Tibau. Numa dessas vezes, Papai me levou para dar um grande passeio. Fomos no “Caetano” de propriedade de Tia Alvani. Foi quando conheci e fiquei muito amigo do primo Rui, que era surdo mudo, mas muito gente boa. Depois fomos à Natal. Tempos depois soube que Mamãe não sabia do tal passeio e que ficou desesperada sem saber onde eu estava.

Em 1976 fomos eu, TT, Lana Mara e Mamãe para Recife e em 1978, para Goiânia, onde estavam Zé Wilson, Socorro e Regina. Naninho havia seguido para São Paulo para trabalhar. Moramos por algum tempo com Socorro, já casada com Nikolas. Regina havia se casado com Sidnei e Zé Wilson com Dinair. Depois, eu TT e Lana Mara assumimos as despesas e nos mudamos para um apartamento e, por fim, compramos um apartamento para nós. Por último, trocamos o apartamento em uma casa, onde hoje mora minha irmã Lana Mara.

Em 1984, mamãe e papai encontraram-se por ocasião do meu casamento, em Guiratinga/MT. É de lá que temos uma das raríssimas fotos em que aparecem os dois no mesmo quadro, embora distantes um do outro.

Depois do meu casamento, fui visitar Papai em Mossoró por duas ou três vezes e nos falávamos por telefone eventualmente. Nunca tive oportunidade de ter uma conversa franca e aberta com ele a respeito de tudo o que havia acontecido, nem sobre suas ações e motivações. 

Em Goiânia, Papai foi por diversas vezes. Teve uma época até que, incentivado por meu cunhado Nikolas, marido de Socorro, aventou-se a possibilidade de ele ir clinicar em Goiânia, mas tudo não passou disso. Na última vez, em março de 1987, no batizado dos meus filhos, já bastante debilitado, ficou em nosso apartamento. Todos lhe davam atenção e o tempo todo, lhe traziam água, café, abraço, beijo, carinho, conversas, piadas. Papai se sentava à mesa da cozinha e tomava sua cerveja diária. Por um breve tempo, Papai viveu a experiência da vida em família, junto com seus filhos, dos quais abriu mão voluntariamente. Mamãe jamais tornou a falar com ele, exceto uma vez em que, acidentalmente, atendeu o telefone. A mágoa e o sofrimento eram grandes demais para serem esquecidos.

No fim de março ou começo de abril, Papai retornou para Mossoró, para passar o seu último aniversário em companhia de suas irmãs, por quem abriu mão de tudo que lhe era mais caro e sagrado, pois sabia que morreria naquele ano. Ele jamais errou um diagnóstico, incluindo o seu próprio. Ao chegar à Mossoró, encontrou sua casa vazia. Praticamente todos os móveis e eletrodomésticos tinham sido levados. Soube depois que haviam sido seus próprios familiares. Ligou então para minha irmã Socorro e, chorando muito, lhe disse:

- Corrinha, diga a sua mãe que hoje eu sei que ela estava certa. Uma parte da minha família, que ela sabe qual é, não vale nada. Diga que eu mandei pedir a ela que me perdoe por tudo. E a todos vocês também, me perdoem.

Em seus últimos anos de vida, Papai passou a viver em um mundo de memórias, de um tempo em que era jogador de futebol, como se buscasse no seu interior um modo de refazer a sua história.

No aniversário de Socorro, sete dias antes de sua morte, Papai ligou para ela pela última vez e tiveram o seguinte diálogo:

- Oi Corrinha. Eu sou mais feliz do que Jorge Bem, porque ele tem uma nega chamada Tereza e eu tenho duas, uma Tereza e uma Socorro (e deu sua risada característica). Corrinha, diga a Naninho (que faz aniversário no dia 15 de julho) que eu desejei a ele muitas felicidades e lhe dê meus parabéns, porque não vou poder ligar para ele.

- Por que papai? Ligue. O senhor parece que tá tão ofegante, cansado.

- Não, é porque a perna esta doendo muito hoje e não sei se vou conseguir ligar para ele. Mas olhe: eu dei o dinheiro e mandei Fernando José (filho de Vera) colocar no correio um presente para você e outro para Naninho. O seu é uma pulseirinha de ouro e o dele é um cordãozinho com um crucifixo. Foi o que eu pude comprar.

- Mas não precisava se preocupar com isso não, home.

- Agora, Corrinha, já deve esta chegando. Se não chegar, pode cobrar dele, viu?

Esses presentes jamais chegaram!

Mamãe, desde que chegou a Goiânia, passou a ter uma vida extremamente caseira, excetuando-se as viagens e as visitas que recebe eventualmente. Mora em companhia do meu irmão Carlos, do qual recebe a atenção e os cuidados necessários. Adora televisão, fazer palavras cruzadas, cantarolar e por último, assobiar. Em 2008, foi comigo em Sobral e teve a oportunidade de rever a “Casa Grande”, a qual se encontrava em semi-ruinas. Enquanto ela passeava pelos cômodos, milhares de lembranças permeavam seus pensamentos e lhe transportavam para uma época de sua vida em que foi muito feliz. Seu semblante era de pura divagação. Fazia comentários eventuais:

- Aqui havia uma linda cristaleira.

- Aqui era o quarto do vovô.

- Ali eram os quartos dos empregados.

Todas, sem exceção, da família ou não, que conheceram e conviveram com Mamãe, nutrem por ela um imenso carinho. Sempre muito educada, delicada e elegante, Mamãe cativa rapidamente as pessoas. Sua vida é um roteiro caprichosamente escrito por Deus, no qual as emoções experimentadas são extremas, capazes de moldar uma pessoa ímpar, de caráter inabalável.

Do alto dos seus 84 anos, é portadora de uma nobreza própria de suas origens e de um espírito altruísta que marcou toda a sua vida. O seu imenso amor e dedicação à família marcaram a todos e foram exemplos para seus filhos e filhas.

Mamãe conta hoje com os seus sete filhos, quinze netos e duas bisnetas.

 Olga e seus sete filhos 2011

Tereza (TT), Regina, Socorro, Carlos (Naninho), Zé Wilson, Lana Mara, Bias e Olga. 

Com imenso carinho e admiração profunda, do seu filho Bias.

5 comentários:

  1. Parabéns...muito bem escrito e, principalmente, emocionante demais!!! Adorei saber de tantas coisas e ver todas essas fotos!

    Da neta Marcela, filha de Regina

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  2. Com certeza essa é a mais fiel e perfeita história da vovó!! Tio, achei lindíssima e fiquei emocionada com tudo (estou até agora chorando). Espero que meu avô, onde ele estiver, saiba do amor de todos. Quanto à vovó, como ela mesma diz: "vixe Maria...que coisa linda!!!". Amo vocês e parabéns por ter descrito com tanto carinho a belíssima vida da minha iluminada avó. Beijos da neta primogênita e de sua primeira sobrinha, é claro. Paulinha

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  3. Olá Bias! Estava eu pesquisando sobre a família Leão e em especial sobre o seu pai e dei de cara com essa belíssima história. Aproveitei para acrescentar mais alguns nomes e datas na árvore genealógica que estou montando. Pesquisando José Arset Leão de Moura acabei por descobrir a grandeza de uma mulher chamada Olga Maria Mendes Leão, além de vários detalhes da família até então desconhecidos por mim. Você não fala o seu nome na história, mas deduzi que você é o Raimundo Bias com quem tive boas conversas em Mossoró quando você vinha visitar o seu pai. Sempre tive muita curiosidade em saber de onde surgiu o "Arset".
    Meu nome é José Leão e sou neto de Mercês, filho de Leomar. joseleao13@yahoo.com.br

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  4. Olá Sr. Bias. Minha tia e madrinha, Maria do Socorro Monteiro, cearense e residente em São Paulo há mais de trinta anos, pediu a mim que procurasse na internet sua velha amiga Regina Mendes Leão, cuja mãe se chamava Olga e a irmã Maria do Socorro como ela. Acredito que Regina seja sua irmã. Eu me chamo Marília Monteiro, sou filha de Vera Mônica Monteiro irmã de Ma. do Socorro (amiga da Regina). Minha tia há muitos anos perdeu contato e busca notícias de sua grande amiga Regina. O email da minha tia é monteiroimobiliaria@terra.com.br Caso seja possível, gostaria que o Sr. me informasse o email ou outra forma de contato de sua irmã para o meu email: marilia_noleto@hotmail.com.
    Grata pela atenção,
    Marília Monteiro Noleto de Albuquerque
    Fortaleza, 27 de março de 2012.

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    Respostas
    1. Olá Marília, tudo bem?
      Enviei um e-mail para você com as informações solicitadas. Espero que tenha ajudado.
      Abraço.
      Bias

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